Washington tenta envergonhar a Ásia por “ceder” à China

TONY CARTALUCCI
tradução de btpsilveira

Está se tornando cada vez mais claro que a influência dos Estados Unidos – apesar do tão badalado “Pivô para a Ásia” – está em declínio através da região do Pacífico Asiático. Washington está sofrendo derrotas geopolíticas em virtualmente cada nação da região, incluindo aquelas agora lideradas por regimes que foram meticulosamente organizados, financiados e apoiados pelos EUA por décadas. Por outro lado, essa influência está diminuindo também entre aquelas nações consideradas aliadas cruciais dos Estados Unidos por longo tempo.

Aqui se pode incluir a Tailândia, no sudoeste asiático, de quem os Estados Unidos repetidamente fazem lembrar ao mundo que tem sido aliada de Washington desde a Guerra Fria e durante a Guerra do Vietnã, e alegadamente, mesmo antes disso.


Dificuldades fundamentais são a causa da queda na influência de Washington 

No entanto, na realidade a Tailândia está desarticulando a influência dos Estados Unidos sobre o país e ao mesmo tempo diversificando seu comércio e cooperação com uma grande variedade de países – incluindo a China – como um meio de não manter laços de dependência com uma nação em particular.

Primariamente dentro da Ásia – é assim que a Tailândia está mudando o foco de sua economia, com a maioria de suas exportações e importações ocorrendo igualmente entre China, Japão e países do ASEAN, com o ocidente representando um pequeno – embora não insignificante – mercado para a nação tailandesa.

Não é por coincidência que os laços geopolíticos da Tailândia refletem seus laços econômicos pelo mundo afora – colocando à luz que as realidades econômicas e políticas sociais estão dirigindo as relações intencionais dos países asiáticos, independentemente da vasta gama de recursos de “soft power” (poder de influenciar, mas poderíamos também significar “poder de pressionar” – NT) à disposição dos Estados Unidos.

Uma rápida olhada nos suprimentos militares da Tailândia pode revelar uma estratégia similar de diversificar as aquisições de armamento e realização de parcerias, assim como o desenvolvimento de sistemas através da indústria local. O que costumava ser um exército dominado totalmente por equipamento e exercícios militares (norte)americanos, está se transformando, com a aquisição de tanques chineses, aviões europeus, rifles de assalto do Oriente Médio, helicópteros russos e veículos blindados feitos na Tailândia mesmo – bem como os exercícios militares conjuntos são hoje realizados com uma variedade de nações, incluindo, pela primeira vez, a China.

Uma mudança parecida está ocorrendo através do resto da Ásia, com a China assumindo com naturalidade uma grande parte da cooperação regional, devido ao seu tamanho geográfico, econômico e demográfico.

A transformação da Ásia era completamente previsível, e apesar do fato de que os Estados Unidos tentam “conter” a China e preservar sua influência através do resto da Ásia, estão ignorando fatores fundamentais de economia e política social, privilegiando, ao invés disso, a coerção através de “acordos de comércio”, tentando elaborar “alianças” militares pela criação e perpetuação de estratégias artificiais de tensão tanto dirigidas contra aqueles países que estão em sua alça de mira (leia-se China), como através dos países asiáticos como um todo.

Ao invés de fundamentação, mais prestidigitação

Os Estados Unidos, aparentemente indiferentes aos fatores que acabaram por levar ao seu declínio gradual na região do Pacífico Asiático, decidiram aumentar ainda mais a aposta na prestidigitação do “soft power”, ao invés de examinar e implementar fundamentação econômica.

Neste quadro, podem ser incluídas as tentativas e programas para a cooptação de jovens lideranças na região, a fim de promover os interesses dos Estados Unidos, em uma tentativa de reverter politicamente os ganhos econômicos e geopolíticos obtidos pela Ásia.
Também inclui uma implacável e interminável campanha de propaganda enganosa retratando as nações através da Ásia como se estivessem se rendendo aos interesses chineses em uma pletora de questões que na realidade são transparentemente de inteiro interesse daqueles países.

Um editorial recente no Bangkok Post – jornal literalmente criado pelo governo dos Estados Unidos - “Destino de Wong volta-se contra o regime,” trata-se apenas de uma tentativa de arguir a recente deportação de um agitador financiado pelos Estados Unidos em Hong Kong de volta para a China como simbolizadora da “rendição” de Bangkok a “todos os caprichos” chineses.

O artigo afirma:

A detenção por 12 horas do conhecido ativista democrático de Hong Kong, Joshua Wong, no aeroporto de Suvarnabhumi acabou por se tornar um tiro no pé contra o regime militar na medida em que as críticas tem jorrado tanto entre os ativistas de direitos humanos, tanto locais quanto internacionais, em relação à excessiva acomodação da Tailândia aos desejos de Pequim.

A seguir, o editorial relaciona outros acordos recentes entre Bangkok e Pequim, afirmando que todos eles aconteceram em estrita obediência às conveniência dos chineses. Entre eles, a deportação de terroristas suspeitos para a China, os quais tinham como destino a Turquia, e provavelmente deveriam se juntar às organizações terroristas que operam na Síria.

O que é bom para a China é bom para a Ásia

Acontece que na realidade, Joshua Wong já admitira que tentara entrar na Tailândia para ajudar a espalhar em Bangkok a mesma hostilidade apoiada pelos Estados Unidos que ele já ajudara a promover em Hong Kong. Mais especificamente, ele tinha encontrado com agitadores apoiados pelos EUA em Bangkok, os quais fazem parte de uma das muitas frentes que tentam promover o desmonte do poder político em favor de partidos patrocinados pelos EUA.

Dessa forma, é fácil entender que a deportação de Wong de volta para a China é do interesse tanto de Bangkok quanto de Pequim.

Além disso, a deportação de suspeitos de terrorismo para a China beneficiam ambas as nações. A Tailândia por muito tempo serviu de canal para os terroristas que se dirigem para a Síria – caso a Síria eventualmente entre em colapso sob a pressão dos terroristas apoiados e armados pelos Estados Unidos – isso levará a um estado de instabilidade de proporções globais, a qual fatalmente reverberará para a Ásia, afetando tanto a China quanto a Tailândia.

As tentativas de Washington para desestabilizar a China – principal parceiro comercial para quase todas as nações asiáticas – é uma ameaça direta para toda a região, não apenas para Pequim.

Não se trata de “ceder” a Pequim, quando se trata de assegurar a própria estabilidade e também que os Estados Unidos não sejam capazes de ter “sucesso” em seus esforços para provocar instabilidade na Ásia, como já fizeram no Norte da África e no Oriente Médio, levando toda a região para a guerra, a morte e o deslocamento de dezenas de milhões de pessoas, o colapso socioeconômico de nações inteiras, além do potencial para levar várias regiões do planeta para uma guerra maior e mais direta.

Uma ironia final que o Bangkok Post “esquece” de mencionar na sua transparente propaganda enganosa é o fato de que, mesmo longe dos interesses chineses, a Ásia for forçada, por décadas, a “ceder” a todos os caprichos de Washington. Não é nenhuma surpresa que um jornal que foi fundado por um antigo funcionário da inteligência (norte)americana e financiado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos possa exibir em suas páginas toda sorte de excepcionalismo vergonhoso que os EUA não se cansam de exibir pelos palcos internacionais do mundo afora.

No entanto, este “excepcionalismo” é corrosivo e contraprodutivo, e a Ásia já decidiu que não precisa mais dele para o futuro.

Quanto mais rápido Washington for capaz de reconhecer e aceitar estes fatos, mais rápido poderá realinhar racionalmente suas relações com a Ásia com algo mais tangível e mais construtivo. Quando Washington aceitar a Ásia como uma região independente e auto suficiente, e como um competidor significativo, poderá decidir se essa competição se desenrolará numa atmosfera saudável e construtiva ou de guerra perpetuamente iminente.



TONY CARTALUCCI – é um escritor e pesquisador geopolítico baseado em Bangkok.

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