A obra prima diplomática da Rússia na Síria: Todos vencem
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“Moscou e Damasco sempre foram contra qualquer forma de divisão ou presença estrangeira ilegal na Síria”
A diplomacia russa conseguiu manter contatos com todas as partes do conflito, apesar de sua posição contra a divisão e presença estrangeira ilegal. Conversações trilaterais entre Irã, Turquia e Rússia ocorreram em Astana por insistência russa. Putin logrou juntar o governo sírio e grupos oposicionistas em Sochi para discutir o futuro da Síria. Em Genebra, Moscou foi o mediador entre Damasco e a comunidade internacional, blindando a Síria contra as armadilhas diplomáticas dos Estados Unidos e demais inimigos do país.

Como consequência de sua derrota na Síria, a Turquia agora mantém um diálogo ativo com Moscou e Teerã. Já que as relações de Ancara com a União Europeia e EUA experimentam uma derrocada, Moscou viu uma boa oportunidade de aproximar Turquia e Síria.
A operação russa foi muito complicada e exigiu uma boa dose de paciência; mas graças às negociações supervisionadas pela Rússia e com a bravura e coragem dos soldados do exército sírio, quase todos os bolsões de terroristas através do país foram eliminados progressivamente.
Além da província de Idlib, o principal problema de Damasco está na ocupação dos Estados Unidos no noroeste do país, sob o pretexto de proteger os curdos contra o “regime de Assad”, assim como “lutar contra o Estado Islâmico”.
Neste momento, Erdogan está encurralado, espremido entre uma economia em colapso e a ameaça de seus próprios aliados (a compra do sistema russo S-400 deixou muitas cabeças quentes em Washington e na OTAN): ele precisava desesperadamente de qualquer tipo de vitória para apresentar à sua base na Turquia.
Essa pode ser a principal razão que levou à decisão de Erdogan de se mover para a Síria sob o pretexto de que o YPG é uma organização terrorista ligado ao PKK – manejando para criar uma zona de exclusão na fronteira entre Síria e Turquia e declarando “missão cumprida”, para alavancar sua popularidade.  
Quanto a Trump, ele está desesperado para desviar a atenção dos desenvolvimentos do impeachment (uma farsa), e também precisa de um tipo qualquer de vitória para apresentar a sua base. Afinal, o que poderia ser melhor que fazer isso através de uma retirada mínima de tropas dos EUA da Síria, deixando os curdos entregues a própria sorte (a preocupação de Trump com os curdos do SDF é quase nula, dado que eles são mais ligados politicamente ao partido Democrata), enquanto declara vitória sobre o Estado Islâmico pela enésima vez nos últimos meses?
Através de uma enxurrada de tweets direcionada contra os “gastos absurdos” do Pentágono e guerras dos Estados Unidos, Trump e sua base jogam confete uns nos outros lustrando sua lealdade para a doutrina “America First”.
Erdogan e Trump até deram um jeito de resolver o constrangedor conflito dentro da OTAN entre Turquia e Estados Unidos, chegando provavelmente a restabelecer o relacionamento pessoal (apesar de conversações duras a partir da Casa Branca).
O acordo entre os Curdos (SDF) e Damasco é apenas a conclusão natural dos acontecimentos trabalhosamente costurados por Moscou. A instalação de tropas sírias e russas na fronteira com a Turquia é o prelúdio da reconquista pela Síria da integridade de seu território – resultado desejado pelo Kremlin desde o início dessa obra prima da diplomacia russa.
Washington e Ancara jamais estiveram sequer próximos de impedir Damasco de reunificar o país. Moscou chegou a conclusão que, cedo ou tarde, Washington e Ancara corrigiriam sua estratégia, mesmo que fosse através de proclamar vitória para suas respectivas bases, apesar da derrota na Síria. Foi exatamente o que Putin e Lavrov conseguiram nas últimas semanas, oferecendo a Trump e Erdogan a solução para seus problemas sírios.
Trump estabelecerá que tem pouco interesse em países a mais de 10000 km dos EUA; por sua vez, Erdogan (com alguma relutância) afirmará que a fronteira entre Turquia e Síria, desde que nas mãos do exército da Síria, garante a segurança contra os Curdos.
Sem dúvida, Putin aconselhou Curdos e Sírios para começar um diálogo sobre os interesses comuns da Síria. Com certeza também convenceu Erdogan e Trump da necessidade de aceitar os planos.
Afinal, trata-se de um acordo que beneficia Damasco e Moscou, traz a salvação para os curdos e ao mesmo tempo deixa Erdogan e Trump com ares de dignidade para suas bases, tudo dentro de uma situação difícil de explicar tanto para a audiência doméstica quanto para a internacional.
Os russos começaram patrulhas conjuntas com o exército sírio nas fronteiras com a Turquia com o objetivo de impedir embates militares entre Ancara e Damasco. Caso os turcos suspendam sua operação militar nos próximos dias, Damasco terá readquirido controle sobre os campos de petróleo.
Nesse caso, o mundo terá testemunhado uma das grandes obras primas da diplomacia mundial jamais concebidas, que pode vir a ser responsável pela aproximação do fim do conflito sírio, que já dura sete anos.
Federido Pieraccini é um escritor independente. Um freelancer especializado em assuntos internacionais, militares e estratégicos.



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