O pacto Irã/China Impulsiona a Nova Rota da Seda


Texto de Pepe Escobar (no site The Saker, com autorização do autor e do site Asia Times) – Tradução por btpsilveira

A China investirá $400 bilhões de dólares na infraestrutura e energia iraniana, mas nada no pacto estratégico permite a presença de tropas chinesas ou entrega de ilhas.

No contexto da Nova Rota da Seda – o cardinal projeto de integração econômica da Eurásia no Século 21 – duas das “ameaças estratégicas” para os Estados Unidos se tornam cada vez mais próximas. O Estado Profundo não acha a menor graça.


O porta voz do Ministro de Relações Exteriores iraniano, Abbas Mousavi classificou a série de rumores sobre o “roteiro transparente” incorporado na parceria estratégica Irã/China em andamento como “mentiras”.

Isto foi complementado pelo chefe de gabinete do presidente Rouhani, Mahmoud Vezi, que afirmou: “iniciou-se fora do Irã uma linha destrutiva de propaganda, dirigida contra a expansão das relações iranianas com seus vizinhos, especialmente (com) a China e a Rússia.” Vezi acrescentou: “esse roteiro, no qual se delineia o caminho que expandirá as relações entre governos e setores privados está assinado e continuará sendo assinado entre muitos países.”

Evidentemente, tanto Mousavi quanto Vezi referiam-se a uma reportagem sensacionalista a qual, mesmo sem acrescentar nada ao que já se sabia sobre a parceria estratégica, disparou previsivelmente um grande sinal de alerta vermelho sobre a aliança militar.

Afinal, a parceria estratégica Irã/China foi oficialmente estabelecida em 2016, quando o presidente Xi visitou Teerã.

Dois artigos são particularmente relevantes entre os 20 que fazem parte do acordo.

O item 7 define o alcance da parceria dentro da visão da integração da Eurásia pela Nova Rota da Seda: “O lado iraniano dá boas vindas para ‘o Cinturão da Rota da Seda Econômica e a Rota da Seda Marítima do Século 21’ inciativas introduzidas pela China. Confiando em seus respectivos pontos fortes e supremacia bem como as oportunidades oferecidas através da assinatura de documentos como o ‘Memorando de Entendimento (MOU, na sigla em inglês – NT) para o fortalecimento das capacidades e investimentos industriais e minerais’ ambos os lados deverão expandir investimento e cooperação mútuos em várias áreas, entre elas transportes, ferrovias, portos, energia, indústria, comércio e serviços.”

O item 10 elogia a participação do Irã no AIIB: “o lado Chinês valoriza a participação do Irã como “Membro Fundador” do Banco Asiático de Infraestrutura e Investimento (AIIB, na sigla em inglês – NT). Os dois lados pretendem fortalecer sua cooperação em áreas de relevância e unir esforços para o progresso e prosperidade da Ásia.”

Afinal, qual é o acordo?

O cerne da parceria estratégica entre Irã e China – e não há qualquer segredo nisso pelo menos desde o ano passado – gira em torno de um investimento pela China de $400 bilhões de dólares na energia e infraestrutura iranianas pelos próximos 25 anos. Tudo tem a ver com assegurar o supremo interesse nacional chinês: um grande suprimento de petróleo e gás, evitando o perigoso gargalo do Estreito de Malaca, garantindo ainda um desconto médio de 18% e pagamento ou em Yuan ou em um conjunto de moedas, ignorando o dólar (norte)americano.

Pequim investirá outros $228 bilhões de dólares na infraestrutura iraniana – é aí que entra o AIIB – nos próximos 25 anos, mas especialmente até 2025. O investimento vai da construção de fábricas até a extremamente necessária renovação da indústria de energia e a construção já em progresso da ferrovia elétrica de 900 quilômetros de Teerã a Mashhad.

Teerã, Qom e Isfahan também serão ligados por uma ferrovia de alta velocidade – e haverá uma extensão até Tabriz, importante centro de petróleo, gás e produtos petroquímicos e ponto inicial do gasoduto Tabriz-Ancara.

Todo o exposto até aqui faz total sentido em termos de Nova Rota da Seda, com o Irã como uma encruzilhada essencial. Ferrovias de alta velocidade atravessarão o Irã conectando Urumqi (em Xinjiang, China) a Teerã, através de quatro “stões” da Ásia Central (Cazaquistão, Quirguistão, Uzbequistão e Turcomenistão) até a Ásia Ocidental, através do Iraque e Turquia para acessar a Europa: um renascimento tecnológico da Antiga Rota da Seda, onde a língua mais falada no comércio entre Oriente e Ocidente através da região central era persa.

Os termos finais da cooperação militar aérea e naval entre Irã, China e Rússia ainda não foram alcançados – como me disseram fontes iranianas. Parece que ninguém tem acesso aos detalhes. O que Mousavi disse (no twitter) foi que “nada há [no acordo] sobre entregar ilhas iranianas para a China, nada sobre a presença de forças militares ou outras falsidades”.

O mesmo se aplica à – totalmente falsa – especulação de que o PLA (Exército de Libertação Popular – NT) chinês teria a garantia de que poderia erguer bases e estacionar tropas no território do Irã.

No último domingo, o Ministro de Relações Exteriores iraniano, Javad Zarif ressaltou que o Irã e a China estariam negociando “com confiança e convicção” e que não há “nada de secreto” quanto ao acordo.

Os negociadores russos, iranianos e chineses encontrar-se-ão no próximo mês para discutir os termos do acordo de cooperação militar entre os três centros de integração da Eurásia. Estima-se que em novembro essa cooperação mais próxima deve ter início.

Geopolítica e geoeconomicamente, o ponto principal é que o bloqueio implacável da economia iraniana feito pelos EUA, usando sanções duríssimas como arma, é impotente para fazer qualquer coisa sobre o amplo acordo entre China e Irã. Aqui (vídeo em inglês – NT) uma boa exposição dos fatores em jogo.

A parceria estratégica entre os dois países é mais uma demonstração gráfica do que pode ser entendido como o tipo chinês do excepcionalismo: uma mentalidade coletiva de planejamento minuciosamente organizado, capaz de estabelecer uma parceria econômica, política e militar de amplo espectro onde todos ganham.

É muito instrutivo colocar todo o processo dentro do contexto do que o Conselheiro Estatal e Ministro de Relações Exteriores Wang Yi ressaltou em recente encontro de Think Tanks EUA/China, onde, entre outros, compareceu Henry Kissinger:

 “Em anos recentes, paira uma visão particular alegando que o sucesso da orientação adotada pela China será um golpe e uma ameaça para o caminho e sistema ocidental. Essa afirmação é inconsistente com os fatos, e não podemos concordar com ela. Nos genes da nação chinesa estão ausentes a agressão e a expansão através de cinco mil anos de história. A China não replica o modelo de outros países, nem quer exportar o seu próprio modelo para os outros. Nunca exigimos que outros países nos imitem. Há mais de 2500 anos, nossos antepassados defenderam que ‘todos os seres vivos podem crescer em harmonia sem que um prejudique o outro e caminhos diferentes podem correr em paralelo sem que um interfira com o outro’”.

https://thesaker.is/iran-china-pact-turbocharges-the-new-silk-roads/

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