Depois do Brexit e do significativo avanço da influência dos eurocéticos e os populistas na Europa, o futuro da União Europeia parece que vai deixando de ser problema. Mas fato é que o futuro permanece aberto e, portanto, há mais de um cenário possível.
O Conselho de Inteligência Nacional dos EUA propõe três opções para o desenvolvimento dessa situação: duas negativas e uma positiva.
Um Cenário de Colapso tem baixa possibilidade de ocorrer, mas implicaria altíssimos riscos internacionais. Nesse cenário, empresas domésticas e as famílias respondem a indicações de uma iminente mudança no regime monetário com corrida para retirar seus euros depositados em instituições financeiras domésticas. Seguindo-se contágio para outros estados-membros e dano econômico para os países-núcleo, o euro seria a primeira vítima a tombar. A União Europeia como instituição seria provável vítima colateral, porque o mercado único e a liberdade de movimento por toda a Europa ficariam ameaçados pela reinstituição de controles sobre capitais e fronteiras. Nesse cenário, deslocamento econômico severo e fratura política levariam a uma ruptura na sociedade civil. Se o colapso for repentino e inesperado, muito provavelmente disparará uma recessão global ou outra Grande Depressão.
Num Cenário de Declínio Lento, a Europa consegue escapar dos aspectos piores da atual crise, mas não consegue fazer as reformas estruturais necessárias. Como os estados-membros já vêm de vários anos de baixo crescimento, mantêm-se unidos para evitar maiores rupturas políticas e econômicas. As instituições da UE são mantidas, mas o descontentamento das populações mantém-se alto. O euro sobrevive, mas não a ponto de rivalizar com o dólar ou o renminbi. Dados os muitos anos de baixo crescimento econômico, a presenta internacional da Europa é reduzida; os países renacionalizam as respectivas políticas exteriores.
Nosso terceiro cenário, de Renascimento, baseia-se no padrão bem conhecido de crise e renovação, que a Europa já conheceu muitas vezes no passado. Tendo olhado diretamente na cara do abismo, muitos líderes concordam com promover um "salto federalista". A opinião pública apoia esse passo, dados os riscos iminentes que advêm de se manter o status quo. Uma Europa mais federal pode começar com apenas um grupo central de países da zona do euro que escolham, optem ou adotem política de 'esperar-para-ver'. Ao longo do tempo, apesar de haver uma Europa de várias pistas de velocidade, o mercado único ainda seria completado; e definir-se-ia uma política de segurança mais unida, com elementos reforçados da democracia europeia. Influência europeia aumentaria, reforçando o papel da Europa e das instituições multilaterais no palco mundial.
Ilaria Maselli, economista sênior para a Europa na The Conference Board (associação independente de pesquisa de negócios), propôs quatro cenários possíveis para a União Europeia:
Estagnação Continuada. Uma combinação de reforma inadequada e baixo crescimento global prolonga o clima presente. Esse cenário traz vantagens principalmente para empresas focadas na demanda doméstica, e muito do crescimento lento advém do gasto dos europeus em consumo. O investimento do setor privado hesita ante a alta incerteza política, enquanto o investimento público fica paralisado pelo medo de se separar com firmeza e para sempre, da 'austeridade' [de fato, é arrocho].
Um Reset. Uma combinação de reforma e crescimento global mais alto resulta num 'reset'. Sob o guarda-chuva da UE, os governos renovam seu compromisso com investimento futuro e removem barreiras comerciais. Renovam também a atenção à desigualdade de renda e de riqueza, dentro de cada país e entre os países. Ventos de popa de crescimento global ajudam a financiar o esforço, bem como a decisão de pôr fim ao quadro da 'austeridade' [de fato, é arrocho] e aumentar os gastos do estado mediante um orçamento único menos rígido. Porque muitas diferentes fontes e fatores contribuem para o crescimento, businesses de todos os setores beneficiam-se nesse ambiente. A vida é bela, mesmo que não seja igualmente bela em todos os pontos. Esse cenário exige também que um subconjunto dos 27 países mova-se na direção de uma união política.
Na Corda Bamba. Uma combinação de reforma institucional no nível europeu com fraco crescimento global leva a alta incerteza. A decisão de reformar vem em resposta a pressões por todo o continente, incluindo o Brexit. Resultado disso, os estados-membros e a União Europeia têm de andar numa corda bamba entre gerenciar aspirações e criar crescimento suficiente. Reformas demoram a gerar os resultados que se esperam, e no meio tempo, o crescimento da produtividade pode tornar-se mais lento. Por causa da fraca demanda externa, os gastos do governo desempenham papel substancial para estimular a economia. Assim sendo, esse cenário mais favorece os negócios do que garante o provimento de serviços públicos
Só Conversa (promessas verbais e ação nenhuma). Publicamente, os países não se cansam de 'promover' a integração europeia, mas na realidade encontram as respectivas fontes de financiamento fora do bloco. Nesse ambiente, negócios bem-sucedidos incluem principalmente os exportadores localizados na Europa Continental – seus empregados, fornecedores e também os acionistas. Numa combinação com reforma inadequada, a existência do Mercado Único só beneficia alguns países, enquanto a renda em outros torna-se estagnada; assim só crescem as fraturas que dividem a Europa.
Se a situação é considerada objetivamente, nesse caso os dois cenários positivos (um Renascimento, na versão dos EUA; e um Reset (na versão da UE) mostram-se praticamente irrealizáveis. As instituições políticas da UE estão tomadas por controvérsias. A burocracia não consegue dar conta dos desafios correntes, e o impacto das forças externas (por exemplo, a situação na Romênia) pode ainda desempenhar papel crítico. O marcado esfriamento das relações entre EUA e Alemanha, mesmo no plano retórico, além do colapso da Parceria Trans-Pacífico exacerbam a atual situação.
Quais são as expectativas russas e qual o prognóstico para o provável futuro da Europa? Ironicamente, a Rússia está interessada numa Europa unida e estável. Mas só há uma condição: tem de ser ator independente, mesmo sendo coletivo. Até agora Bruxelas tem sido uma das peças com que Washington joga no tabuleiro de xadrez da Eurásia. As sanções contra a Rússia, o Projeto da Parceria Ocidental, a Operação "Decisão Atlântica" [Atlantic Resolve] da OTAN – nenhum desses arranjos ou combinações são decisões autenticamente europeias.
Mesmo que se considere uma possível melhora nas relações Rússia-EUA, é indispensável alguma espécie de revisão da integração euroatlântica, para que possa haver relação de confiança entre Moscou e Bruxelas. Idealmente, a integração euroatlântica tem de ser substituída pela integração eurasiana.
Mas a Rússia deve estar preparada para o cenário possível do colapso da UE.
Nesse caso, relações bilaterais com países chaves na região têm de ser intensificadas, embora isso não signifique que as preferências se façam à custa de outras partes. Antes da imposição das sanções, o principal núcleo das relações de exportação-importação entre Rússia e a UE estava na Alemanha, Países Baixos e Itália. As novas condições dos tempos (segundo Fernando Braudel) podem alterar o equilíbrio do poder e as preferências.
Além disso, mudou a base demográfica da UE. Os problemas dos refugiados e migrantesdificilmente serão resolvidos em futuro próximo. Enquanto dentro da UE há algumas ilhas liberais, africanos e asiáticos continuarão a entrar na península europeia e a ali criar seus ghettos e enclaves étnicos. Isso, por sua vez, afetará as políticas sociais e econômicas em vários países. Como a experiência já mostrou, a assimilação baseada no multiculturalismo não é viável. Mas a liderança da UE não parece pronta a tomar quaisquer medidas radicais, por causa da natureza das culturas políticas da UE. Basta isso para levar ao poder na UE novas forças da contraelite? No mínimo, essa parece ser a tendência. Esse cenário pode, talvez, ser alcançado mediante procedimentos democráticos.
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