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Os homens do Daesh (ISIS/ISIL/EI) estão agora lutando aos milhares no país no qual pousamos para “liberar” há 14 anos atrás, além de dezenas de milhares de Talibãs “pressionando” sem parar no “coração” do país, ao redor de Sangin (distrito da Província de Helmand, no Afeganistão – NT).

Resultado de imagem para Robert Fiskpor Robert Fisk
tradução: NirucewKS063 


29 de dezembro de 2015. "Information Clearing House" - "
The Independent" – As notícias oriundas do Afeganistão são realmente ruins. Ninguém fala disso, claro. O Presidente Ghani tem um “governo nacional unificado” que “é apoiado por uma forte parceria com os Estados Unidos”, de acordo com Barack Obama dois meses atrás. Claro, não dá para negar que Kunduz foi capturado pelo Talibã – mas agora os afegãos conseguiram retomá-la (com exceção, é claro, de um hospital bombardeado pelos Estados Unidos juntamente com a maioria de seus médicos e pacientes). Bem, temos que admitir que Sangin foi capturada pelo Talibã mas os afegãos estão lutando para retomá-la também. Ora, mas não morreram mais de uma centena de soldados britânicos para manter Sangin? Sim, sim, mas tropas (norte)americanas no Iraque também morreram para conquistar e manter Mosul – e Mosul atualmente é a casa do líder do Daesh,  Abu Bakr al-Baghdadi. E tropas dos Estados Unidos morreram para capturar Faluja, depois a perderam, depois morreram novamente para recapturá-la – e Faluja agora também está nas mãos do Daesh.


Resultado de imagem para logo talibanNós não inventamos as “notícias ruins” do Afeganistão ou do Iraque. Parece mais um filme que se repete a cada Natal. Apenas duas semanas atrás, o General John F. Campbell, o comandante dos Estados Unidos para as forças da OTAN no país, admitiu que o Daesh apareceu no Afeganistão. Pode haver 3.000, ou 4.000 ou ainda 5.000 homens do Daesh que estão agora a tentar consolidar ligações com seu “navio mãe” no Iraque e na Síria; perceba a linguagem Hollywoodiana aqui. O Daesh quer estabelecer sua pré-afegã “Província Khorasan” na Província de Nangarhar no Afeganistão.


Mas podemos ficar tranquilos. Obama nos assegura que o “compromisso (norte)americano com o Afeganistão e seu povo permanece intacto” e que “os afegãos estão lutando por seu país tenaz e bravamente” e que “continuam a manter a maioria (sic) das áreas urbanas”. As vitórias alcançadas pela Talibã eram “previsíveis”, diz o Presidente (norte)americano, mas quase 10.000 tropas ainda permanecem no Afeganistão – mesmo que a guerra já tenha acabado – e 14 meses atrás, David Cameron disse aos seus próprios rapazes que as conquistas alcançadas no Afeganistão “viverão para sempre”. O para sempre já acabou.

Como o próprio antigo chefe do Estado Maior, General Dannatt, disse na última semana, ele não está “surpreso” com a queda de Sangin. De forma alguma. Afinal, “nós sempre soubemos que a situação, uma vez que deixássemos Sangin, seria difícil. Nós deixamos o Afeganistão em situação de ter tudo sob controle no futuro. Mas não é grande surpresa que o Talibã continue a pressionar no Sul do Afeganistão. De qualquer forma, é a terra deles”.

Resultado de imagem para daesh isis logoResumindo, os homens do Daesh estão lutando aos milhares no país ao qual chegamos orgulhosamente há 14 anos para “libertar”, para não falar das dezenas de milhares de Talibãs “pressionando” em sua “terra natal” em volta de Sangin (e lá se foram as conquistas eternas de Cameron). Para coroar tudo, Obama tem a pachorra de dizer aos (norte)americanos que o ultra corrupto governo afegão é “um parceiro confiável”, um “aliado estável e comprometido”, capaz de ajudar a prevenir “futuras ameaças”.
Como em 1940, quando os soldados alemães estavam entrando aos montes na França – uma invasão muito mais perigosa que esta que faz hoje a obsessão de Cameron, mas exatamente no mesmo âmbito de agora – que Churchill decidiu dizer a verdade para os britânicos. “As notícias da França são muito ruins...” disse. Os soldados britânicos, aos milhares, estava morrendo para conter a invasão. Sua “conquista” não foi uma vitória, mas Dunquerque.

Porém nós ainda não nos permitimos o uso da expressão – “muito ruim” – sobre o Afeganistão. Não... Cameron tinha que falar sobre “conquistas”, mas a mãe de um soldado horrivelmente ferido fala abertamente sobre sua “desesperada sensação de desperdício”. Para o General Dannatt, o futuro bateu à porta para aqueles rapazes do exército afegão. Grandes coisas; nós sempre soubemos que o Talibã  lutaria.

Resultado de imagem para Afghan flagBasta ler os relatos de jornalistas afegãos para saber que a expressão Churchilliana “muito ruim” para o caso do Afeganistão tem ares de otimismo. Vejamos, por exemplo, o caso dos muçulmanos xiitas afegãos Hazara que foram capturados pelos ativistas do Daesh quando estavam no interior de um ônibus indo para Cabul este ano. Os “rapazes” do Daesh pararam o ônibus, sequestraram 30 xiitas e queriam trocá-los por familiares que estavam aprisionados – parece que eram Usbeques – nas mãos do governo afegão. Como de praxe, os cativos foram submetidos ao tratamento padrão do Daesh: pelo menos uma decapitação, dias de tortura ininterrupta, com o acréscimo de vídeos dos xiitas portando coletes suicidas. Só foram libertados depois de nove meses, após um assalto bem sucedido executado pelo Talibã contra os seus captores do Daesh. Sim, os bandidos de repente se tornaram os mocinhos, aqueles mesmos bandidos que haviam capturado Sangin, porque agora estavam lutando contra outros bandidos muito piores que eles. Seria cômico, se não fosse trágico.

Resultado de imagem para Refugee crisisSó para reforçar o tema, tomemos a recente história de um infortunado afegão chamado Qais Rahmani, que, juntamente com sua família e um bebê de quatro meses de idade, partiram misturados ao exército de refugiados para a Europa. Na Turquia tomaram uma embarcação que afundou quase imediatamente. O bebê de Qais morreu em seus braços. Ora, diria você, não passa de mais um Alan Kurdi da vida, mas você sabe, o que realmente chamou a atenção dos afegãos foi que Qais era apresentador de televisão famoso e assim como sua mulher, tinha nível universitário. Os Rahmanis não eram pobres ignorantes no meio da multidão de refugiados, mas aquelas pessoas que deveriam permanecer no país e supostamente participar da construção de um Novo Afeganistão, trabalhando lado a lado com o governo, que está – e cito Obama novamente – “trabalhando para combater a corrupção, fortalecer as instituições e defender o Estado de Direito”.

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Reagan: "Estes homens são equivalentes morais aos pais
fundadores da América (1985)" 
Bem. Tome alguma distância e dê uma olhada no roteiro. O Talibã, em 1996, acabou com a bagunça das milícias desorganizadas e fora da lei e dominou quase todo o país. Acontece que também deu abrigo à al-Qaeda depois dos acontecimentos de 9/11. Indignados, invadimos o Afeganistão para destruir logo os dois de uma vez: a al-Qaeda e o regime vil, misógino, assassino e antidemocrático do Talibã. O Talibã não foi conquistado, nem derrotado, nem nada. Pior: agora, o Talibã está vencendo. Agora nós queremos que ele lute contra o vil, misógino, assassino e antidemocrático Daesh. É por isso que, no final de sua peroração para o povo (norte)americano, Obama disse que todos devemos “premir o Talibã... para que eles façam a sua parte no esforço de perseguir a paz que o Afeganistão merece”. Pois então. O horrível Talibã voltou a ser o bom, o bravo Talibã. Realmente, as notícias do Afeganistão são bem ruins.


Robert Fisk
http://www.informationclearinghouse.info/article43815.htm

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