Vai uma dose de petróleo
russo-saudita?
25/12/2015, Pepe ESCOBAR, Strategic
Culture Foundation
traduzido pelo Coletivo
Vila Vudu
"Sabe quando as empresas russas reduzirão a produção de petróleo? Quando o petróleo custar $0". Cortesia do vice-ministro de Energia da Rússia, Kirill Molodtsov, aí está com certeza uma das melhores frases de 2015.
Bem, esqueçam a coisa de petróleo a $0, mesmo que a OPEP recuse-se a diminuir a produção para reduzir a superoferta mundial.
Quanto à Rússia, podem contar com que continue a extrair como se não houvesse amanhã.
O caso é o seguinte: a Rússia manterá a produção de petróleo em 2016 em espantosas 533 milhões de toneladas – que se traduzirão numa média de 4,76 milhões de barris/dia em exportações.
Beneficiando-se de um conjunto de refinarias mais eficientes, a demanda interna cai e as exportações sobem. Empresas russas de petróleo, comparadas às majors ocidentais, sofrem menos com os baixos preços do petróleo, por causa da desvalorização do rublo e porque os impostos diminuem, se o preço do petróleo cai. Igor Sechin, presidente da Rosneft, costuma vangloriar-se de que "os custos russos são os mais baixos do mundo" – especialmente no petróleo dos campos da Sibéria Ocidental.
A Rússia é o maior produtor global de petróleo do mundo, ao lado do oceano de petróleo que é a Arábia Saudita. E já em pelo menos três vezes, em 2015, a Rússia exportou mais petróleo para a China, que a Arábia Saudita. Encaixa-se perfeitamente no ângulo chave, de energia, da parceria estratégica Rússia-China na Eurásia.
Pode ser sinal de que a Casa de Saud viu a luz – à parte estar sendo gravemente prejudicada pela própria estratégia de forçar os preços do petróleo para baixo. Implicaria, no longo prazo, uma Casa de Saud alinhada mais intimamente com a parceria estratégica Rússia-China – dado que a China é o principal parceiro comercial dos sauditas e, de longe, o maior consumidor de petróleo.
A motivação chave da Casa de Saud para forçar os preços do petróleo para baixo em 2014 foi dobrar a Rússia na questão síria. Agora já se tem o veredito econômico – que se resume a desastre absoluto, com a Arábia Saudita exibindo déficit de 16% do PIB e a avaliação do seu crédito soberano em 2015 rebaixado para "A+/A-1", dos "AA-/A-1+" em que estava, pela agência Standard and Poor's.
A Rússia, por sua vez, não parou de bombear petróleo. E, como se não bastasse, Moscou mandou sua Força Aérea, com toda a pompa, para proteger Damasco.
Significa que a Casa de Saud fracassou essencialmente no projeto de arrancar a fatia de mercado que continua a pertencer à Rússia, e que Moscou e Pequim aprofundaram sua parceria estratégica; crucial, por exemplo, é o fato de que a [empresa] Gazprom Neft – a terceira maior produtora de petróleo da Rússia –, desde janeiro vende a Pequim em moeda chinesa.
À frente está a Rota da Seda
Os preços do petróleo continuarão baixos em 2016. A OPEP
continuará fraturada. Mas a Rússia conseguiu sobreviver, assim como o Irã.
Quanto à Casa de Saud, o prêmio de 'consolação' é que a sua estratégia de preço
baixo conseguiu tirar do mercado mais de um competidor.
Especialistas e insiders norte-americanos do petróleo garantem
que o que realmente faz sentido é Rússia e Arábia Saudita aliadas, não
inimigas. Para a OPEP e o clube do petrodólar do Golfo, reduzir em apenas 10%
sua produção de petróleo, junto com a Rússia, bastaria para fazer dobrar o
preço do petróleo – o qual, aliás, foi derrubado pelos próprios sauditas.
Significaria cerca de $180 bilhões de lucros anuais para a Rússia e outros
tantos para a Arábia Saudita.
Isso torna o acordo de petróleo entre russos e sauditas mais importante a cada dia. Atores poderosos, intimamente ligados a Riad estão tentando fazer acontecer – o que pode levar a uma avenida pavimentada literalmente com ouro.
A reaproximação entre sauditas e árabes da OPEP e a Rússia, e potencialmente com o Irã, abrirá o caminho para que o clube do petrodólar do Golfo integre-se ao maior projeto de infraestrutura global que a história moderna jamais viu: o projeto "Um Cinturão, uma Rota", ou a integração de toda a Eurásia pelo comércio e por infraestrutura de primeira qualidade. As Novas Rotas da Seda chinesas serão progressivamente integradas com a Rússia e com os estados da União Econômica Eurasiana, UEE (ing. Eurasian Economic Union, EEU).
A escolha que se abre diante da Casa de Saud é clara: apostar na integração da Eurásia – e lucrar com ela; ou continuar a armar e ampliar gangues e gangues de doidos wahhabistas. Essa é ação que, do jeito clássico como o chicote volta sobre o lombo do chicoteador, acabará por voltar-se contra a própria matriz ideológica – com os fundamentalistas decidindo-se a tomar Meca.
Mas... que ninguém espere, de uma Casa de Saud paranoica, enlouquecida de medo, que tome decisão racional.
Pepe Escobar
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