O “cemitério de impérios” assombra as Férias de Obama
29 de dezembro de 2015 – Finian Cunningham
tradução: mberublue
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Há pouco o
que o presidente dos Estados Unidos, Barak Obama, possa comemorar durante as
suas férias anuais de fim de ano – enquanto os Estados Unidos continuam
mergulhados em uma guerra além mar – no Afeganistão – a qual se intensifica
sem um final a vista, com prosseguimento para ainda mais alguns anos.
“A guerra no Afeganistão acompanha Obama em
suas férias no Havaí”, foi a
maneira pela qual o Washington Post
descreveu o
panorama desanimador para o regime em Kabul, apoiado pelos Estados Unidos e cada
vez mais assolado pelos militantes do Talibã. Quatorze anos depois de ir para
o Afeganistão para desbaratar os radicais islamitas do Talibã e “instalar a
democracia”, a Washington “construtora de nações” conseguiu apenas erguer um
amontoado de mentiras em cima de ruínas ignóbeis.
Um ano
depois que a operação liderada pela OTAN e pelos Estados Unidos foi oficial e
progressivamente desativada, relata-se que
Forças Especiais britânicas e (norte)americanas estão sendo enviadas – mais uma
vez – para ajudar a prevenir a queda do regime instalado pelo ocidente frente
aos insurgentes Talibãs.
Seis
soldados (norte)americanos morreram quando um
suicida talibã dirigiu sua motocicleta contra a patrulha que realizavam perto
da gigantesca base dos EUA em Bagram. A base de Bagram é o coração das
operações militares dos Estados Unidos no Afeganistão. Nos meses mais
recentes, mesmo lugares reputados como zonas de segurança estão sob ataque de
foguetes do Talibã. A explosão devastadora contra a patrulha (norte)americana
fora da base serve para enfatizar como é frágil a situação no país como um
todo.
Contundentemente,
a morte das tropas dos EUA ocorreu justamente quando Obama prometera marcar a
finalização definitiva das operações militares no país – mais de quatorze
anos depois que os Estados Unidos invadiram o Afeganistão em outubro de 2001.
No último dezembro,
Obama anunciou pomposa e oficialmente o fim das operações no Afeganistão, bem
como o apoio fornecido pelos britânicos e outras forças da OTAN. Neste mês,
supostamente deveríamos ver um longo desfile das tropas remanescentes dos EUA
num total de 9.000 soldados sendo retirados, enquanto os soldados afegãos treinados
pela OTAN bem como as forças policiais sobre controle do presidente afegão
Ashraf Ghani deveriam então assumir a responsabilidade pela segurança.
Afirmou-se
que as tropas remanescentes teriam então um “status de não combatente” e
ficariam aqui apenas para fins de treino e aconselhamento. Mas esse “status
oficial de não combatente” dificilmente fará algum sentido para as famílias
(norte)americanas dos seis soldados mortos nesta semana.
Devido à
rápida deterioração da situação de segurança através do Afeganistão, no meio
de um aumento dos avanços dos talibãs em meses recentes, Washington tem
adiado a retirada de suas tropas desde 2017 e possivelmente irá muito além
disso. Parece que o segundo mandato de Obama expirará antes de vermos a
retirada das tropas.
Receia-se
que a província sulista de Helmand esteja à beira de uma tomada do poder
pelas forças militares do Talibã, e juntar-se-á aos territórios já dominados
pelos militantes no oeste, norte e leste do país. O governo central
sustentado pelos Estados Unidos se encontra sitiado em Kabul e está perdendo
o controle da situação.
Um
legislador provincial afegão citado pelo jornal
The Guardian disse que a província de
Helmand inteira “corre perigo de cair
nas mãos do Talibã” Ele disse: “Se
os britânicos e os (norte)americanos não ajudarem... Helmand estará em perigo”
Em 2008,
Obama ganhou seu primeiro mandato parcialmente porque prometeu dar um fim à
guerra do Afeganistão, que seu predecessor George Bush havia começado,
alegadamente em resposta aos ataques terroristas de 9/11 em Nova Yorque e na
capital, Washington, em 2001. Duas administrações depois, a promessa de Obama
parece pateticamente longe de ser cumprida totalmente. Como no Iraque, Obama
está mandado tropas para o país, embora em escala muito menor do que quando a
guerra estava oficialmente em andamento.
Mesmo que oficialmente
esteja “ativada” ou “desativada” a realidade é que os Estados Unidos ainda
estão em plena atividade guerreira tanto no Afeganistão quanto no Iraque, e
ainda tentando dar apoio aos governos que instalou naqueles países, os quais
tentam desesperadamente conter o caos sectário e tribal desencadeado por
Washington com suas desastradas intervenções ilegais.
De uma
perspectiva financeira, calcula-se que as duas guerras tenham acumulado
juntas gastos de $6 trilhões de dólares do total da dívida dos Estados Unidos
que monta a $18/19 trilhões de dólares, de acordo com um
estudo financeiro realizado pela Universidade de Harvard. É um terço da
dívida esmagadora e insustentável dos EUA, que não só incapacita a sua
própria economia mas seria a principal causa da estagnação da economia
mundial.
Mas ainda
mais devastador para a reputação global dos Estados Unidos são os números
horrendos de perdas em vidas humanas causados pelas guerras dos EUA, que, em
primeiro lugar, são ilegais – e guerras que continuam e continuam sem fim,
visivelmente por causa do vandalismo geopolítico de Washington.
Além
disso, a contaminação global pelo extremismo, terrorismo e grupos como
Al-Nusra, Ahrar ash-Shams, o Estado Islâmico e o Boko Haram pode ser traçada
facilmente até a guerra ilegal dos Estados Unidos contra o Afeganistão e o
Iraque. Seja qual for a autoridade moral que os Estados Unidos possa ter
projetado para o resto do mundo, ela foi desperdiçada. O mundo não mais se
permitirá ser enfeitiçado para aderir a uma posterior Segunda Pax Americana;
ele está muito chocado para aceitar isso.
Inospitável
tanto geográfica quanto climaticamente, o Afeganistão não é chamado pelos historiadores de “cemitério
de impérios” por nada. Nos séculos passados, os guerreiros tribais daquele
país remoto derrotaram implacavelmente as forças de Gengis Khan, Alexandre o
Grande e do Império Britânico. A Guerra de uma década (1979/1989) da Rússia
no Afeganistão contra os Mujahedins – mobilizados e armados pelos Estados
Unidos – reconhecidamente tiveram um papel na derrocada da União Soviética.
Parece que
agora é a vez dos Estados Unidos caminharem em direção ao cemitério, não sem
uma grande dose de ironia e justiça poética, dada a maneira pela qual
Washington colocou a União Soviética em uma armadilha – ou como o antigo
estrategista (norte)americano Zbgniew Brzezinski teria dito: “vamos dar à União Soviética o seu próprio
Vietnã”.
A
diferença é que, ao introduzir novas cepas de terrorismo no país na década dos
anos 1980s para lutar contra a União Soviética, os Estados Unidos só fizeram
agravar a já notória e tradicional resistência do Afeganistão. Os britânicos
com seus serviços de inteligência e sauditas com seu dinheiro fácil do petróleo
também deram uma mãozinha para incrementar ainda mais o já terrível caldeirão
do terror afegão.
Os Mujahedins
apoiados pelos Estados Unidos daquela época são os precursores dos Talibãs
atuais, que estão arrastando Washington para um pântano aparentemente
interminável. Mas não se trata apenas do Talibã, mas também de outros grupos
terroristas ligados à al-Qaeda que se espalharam a partir do caldeirão
fervilhante do Afeganistão e estão executando um terror insano através do
Oriente Médio e em muitas partes da África.
Obama não
sofre com um simples assombro pelo Cemitério de Impérios. Nesse cemitério, os
Estados Unidos cavaram a própria cova.
Finian
Cunningham - nasceu em Belfast,
Irlanda do Norte, em 1963. Especialista em política internacional. Autor de
artigos para várias publicações e comentarista de mídia. Recentemente foi
expulso do Bahrain (em 6/2011) por seu jornalismo crítico no qual destacou as
violações dos direitos humanos por parte do regime barahini apoiado pelo
Ocidente. É pós-graduado com mestrado em Química Agrícola e trabalhou como
editor científico da Royal Society of Chemistry, Cambridge,
Inglaterra, antes de seguir carreira no jornalismo. Também é músico e
compositor. Por muitos anos, trabalhou como editor e articulista nos meios de
comunicação tradicionais, incluindo os jornais Irish Times e The
Independent. Atualmente está baseado na África Oriental, onde escreve um
livro sobre o Bahrain e a Primavera Árabe.
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