As relações entre EUA/Rússia devem tomar rumo inesperado
O Hwasong-14 - RD-250?

texto de M K Bhadrakumar, tradução de btpsilveira

A crise ucraniana – e as relações entre Rússia e Estados Unidos – devem alcançar um ponto de inflexão com as análises feitas pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, na sigla em inglês – NT) em Londres que o salto espantoso na capacidade balística de seus mísseis no ano passado só pode ser atribuído à aquisição clandestina de tecnologia da era soviética que está disponível em uma fábrica perto da linha de frente da zona de guerra no Donbass, perto da região separatista dominada pelos secessionistas.


O IISS sinaliza que o míssil Hwasong-14 da Coreia do Norte, testado duplamente pela primeira vez no último mês significa um inacreditável avanço em tecnologia que é simplesmente inconcebível para o engenho humano – isto é, a menos que Pyongyang tivesse obtido acesso a tecnologia estrangeira de uma potência nuclear já estabelecida.

No entanto, o relatório do IISS afirma:
A máquina testada pela Coreia do Norte não parece fisicamente com nenhum LPE (Liquid-propellant Engine – NT) fabricado pelos Estados Unidos, França, China, Japão, Índia ou Irã. Nenhum desses países também produz um motor que funcione com propelentes estocáveis e gere a potência conseguida pelo Hwasong-12 e pelo -14 LPE. Isso deixa apenas a antiga União Soviética como a fonte mais provável.


Agora, podem ter acontecido transferências clandestinas de motores tanto da Rússia quanto da Ucrânia com o conhecimento de autoridades locais – ou mais provavelmente contrabando efetuado pela máfia a partir das fábricas, que estão muito mal protegidas.

A máfia está ativa tanto na Ucrânia quanto na Rússia. O IISS parece inclinado a apontar o dedo para a fábrica na Ucrânia (conhecida como Yuzhnoye e que tem instalações em Dnipropetrovsk e Pavlograd), que está em grandes dificuldades financeiras desde 2006, quando a Rússia parou de comprar seus produtos como parte da cadeia de suprimentos da era soviética e a antes pujante fábrica chegou à beira do colapso financeiro por volta de 2015. Citando mais uma vez o IISS:

O número total de motores de foguetes RD-250 fabricados na Rússia e na Ucrânia é desconhecido. No entanto, quase com certeza existem centenas, se não mais, de motores sobressalentes estocados nas instalações da KB Yuzhnoye e em armazéns na Rússia. Uma pequena equipe de empregados insatisfeitos ou de guardas mal pagos em qualquer desses locais de estocagem… poderiam ser incentivados a roubar algumas dúzias de máquinas por algum negociante escuso de armas, redes de criminosos ou contrabandistas internacionais operando no espaço da antiga União Soviética. Os motores (que têm menos de dois metros de altura e um metro de largura) podem ser transportados por via aérea, ou, mais provável, através de rede ferroviária da Rússia para a Coreia do Norte. Pyongyang tem muitas conexões na Rússia... agentes norte coreanos em busca de tecnologia de mísseis sabidamente também operam na Ucrânia... Atualmente, as instalações (na Ucrânia) da Yuzhnoye estão fechadas nas linhas de frente do território secessionista controlado pela Rússia. É claro que há muitas rotas possíveis através das quais a Coreia do Norte pudesse transportar as poucas dezenas de motores RD-250 necessárias para o desenvolvimento de um programa de ICBMs.

Surgem várias questões. Importante notar que quase todas elas terão implicações na trajetória das relações entre Estados Unidos e Rússia. Foi muito importante o timing da reportagem do IISS. As relações EUA/Rússia estão caminhando pelo fio de uma navalha. (Veja no meu blog: Russia edgy as US prepares to retaliateem inglês – NT)

Será que a inteligência russa vazou as informações já disponíveis para respeitáveis fontes ocidentais para com isso demonstrar para as capitais dos países ocidentais que eles acabaram criando na Ucrânia uma ferida aberta que está gangrenando aos poucos? (Afinal de contas, o IISS tem ligações profundas com o pessoal da espionagem).

É muito provável que a CIA e o Pentágono já estejam à frente da descoberta do IISS. Teria alguma coisa a ver com as ameaçadoras reportagens que se recusam a morrer de que a administração Trump estaria revisitando a ideia moribunda de fornecer armas letais para atingir os separatistas apoiados pela Rússia no Donbass – ideia refutada com unhas e dentes pela Rússia? Colocando em termos simples, é como se alguém disparasse um sinalizador enorme no céu noturno para enfatizar o ponto da imbecilidade de dar armas letais para a Ucrânia, já que rapidamente essas armas estarão inevitavelmente em mãos de atores não estatais? É algo para se pensar.


Na realidade a Rússia tem interesse em trabalhar em conjunto com a administração Trump para resolver a crise ucraniana. Mas então, a Rússia tem esperança que progressos alcançados sobre a Ucrânia levem a um abrandamento das sanções ocidentais. Neste momento, pelo contrário, a última legislação aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos sobre as sanções contra a Rússia proíbem a Casa Branca de negociar a remoção das sanções sem concordância prévia pelo Congresso. Se já houve um Nó Górdio esperando para ser desatado, é esse.

O IISS conclui enfatizando a grande importância de “os Estados Unidos e seus aliados, junto com a China e talvez a Rússia, negociarem um acordo para banir futuros testes com mísseis, e efetivamente impedir a Coreia do Norte de aperfeiçoar sua capacidade de aterrorizar os Estados Unidos com armas nucleares. Mas a janela de oportunidade se fechará em breve, assim, ações diplomáticas devem ser iniciadas imediatamente”.


No entanto, tal processo exige um alto nível de cooperação e coordenação entre Rússia e Estados Unidos. Claro, ‘Barkis is Willing’ (expressão que significa que alguém está disposto a fazer algo. Surgiu em primeiro lugar no romance “David Copperfield”, de Charles Dickens – NT). Mas... será que os Estados Unidos estão prontos para abandonar as sanções contra a Rússia? Aqui, há uma escolha existencial a ser feita, porque a inteligência russa logicamente deve estar bem atualizada sobre a Coreia do Norte. Paradoxalmente, os Estados Unidos precisam dos recursos da Inteligência russa para proteger o povo (norte)americano de uma potencial radiação nuclear. O relatório do IISS está aqui (em inglês – NT)


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