Alex Gorka, com tradução de btpsilveira
Seis anos
depois, os resultados das Primaveras Árabes continuam a fluir, de várias
maneiras. Pouca atenção se tem dado até agora a um dos maiores países da África
e do mundo árabe. A Argélia permanece imune às reverberações da Primavera
Árabe, com o contexto de sua guerra civil por trás. Este ano,
as coisas podem mudar.
Já existem
protestos contra o rigoroso plano de austeridade imposto pelo governo, que tem
o início marcado para 2017 na Argélia – o barril de pólvora do Norte da África.
O orçamento promulgado pelo presidente Abdel Aziz Bouteflika disparou a
instabilidade social. Novos impostos sobre uma grande variedade de bens de
consumo e corte de 14 por cento no orçamento colocaram ainda mais gasolina na
fogueira do já crescente descontentamento com a corrupção generalizada e falta
de investimento. De mãos atadas pelo alto índice de déficit e uma economia
desequilibrada, o país tem pouco com o que satisfazer as exigências dos
manifestantes.
Apenas no
ano passado, a Argélia perdeu 22% de seu PIB, equivalentes a 50 bilhões de
dólares, pela queda no preço do petróleo e gás. A economia do país está quase
inteiramente baseada no petróleo e no gás, indústria muito lucrativa mas que
produz reduzido número de empregos. Até este momento, as autoridades do país
conseguiram manter o descontentamento em níveis aceitáveis, embora instáveis,
com a política da “vara e a cenoura”, que não mais parece ser capaz de manter a
paz tênue, pois não aborda os assuntos inerentes às questões que causam os
conflitos.
O
Ministro do Interior da Argélia, Noureddine Badawi, ameaça “tratar com mão de ferro qualquer um que ameace a segurança do país”, no
entanto nenhuma promessa de reformas políticas ou econômicas que solucionem os
principais problemas do país foi feita.
A
população do país recebe subsídios generosos em comida e combustível, mas fora
da indústria de petróleo quase nada sobra, a não ser a indústria de turismo,
dificilmente uma opção válida em uma região abalada pela instabilidade. A
infraestrutura atual não é capaz de prover as necessidades de uma população em
crescimento constante (a taxa de natalidade da Algéria é de 25,14%).
A essa
mistura já explosiva, acrescente-se os relatos recentes de que o Presidente
Bouteflika, 80, está seriamente doente, sem que haja um sucessor óbvio, o que
aponta para um conflito político como uma possibilidade real.
No final
de 2016, o International Crisis Group (Grupo de Crise Internacional – ICG na
sigla em inglês – NT) publicou um relatório que fez soar o sino de alarme
quanto à situação na Argélia e as possíveis consequências do ressentimento
popular em crescimento.
Com o
Estado Islâmico em retirada no Iraque, Síria, Líbia e outros locais, a Algéria –
país com uma população de 40 milhões de almas – pode ser vista como uma presa
fácil. Os jihadistas não estão perdendo tempo e estão cada vez mais entranhados
nas áreas ricas em petróleo no sul do país – a vasta área para além das
Montanhas Atlas e o planalto que margeia o Mediterrâneo e que compreende 85% do
território nacional da Argélia, mas menos de 9% de sua população. Desde
dezembro de 2016 o Departamento de Estado dos Estados Unidos emitiu um alerta
contra qualquer viagem para o sul ou leste do país.
No ultimo
mês de outubro o Estado Islâmico (ISIS-ISIL-EI-Daesh) anunciou formalmente o
início de suas operações na Argélia. Seus líderes anunciaram ataques contra
todo o Norte da África, incluindo os países do Magreb. Ameaças terroristas em
Marrocos, vizinho da Argélia, se tornaram mais frequentes com o número de
jovens desempregados e em meio à pobreza rural crescendo exponencialmente.
A Líbia, país
limítrofe, tem uma instabilidade que só faz crescer – onde milícias armadas e
grupos terroristas floresceram desde a queda do governo de Kaddafi em 2011 –
levou a um aumento de tráfico de drogas e armas nas fronteiras com a Argélia. O
exército argelino posicionou tropas e armas ao longo de suas fronteiras com a
Líbia, Tunísia, Mali e Níger, para tentar conter o fluxo de armas e terroristas
para dentro do país.
Em
resposta à crescente ameaça, a Argélia está fortalecendo seus laços com a
Rússia. Comprou recentemente 40 helicópteros de ataque Mi-28 “Night Hunter” da
Rússia. Em setembro de 20-15, Moscou e Argel assinaram um contrato para a
entrega de 14 aviões caças SU-30MKA para a Argélia, entre 2016/2017.
Durante a
visita do Ministro russo de Relações Exteriores, Sergei Lavrov, ao país em
Fevereiro de 2016, a Rússia e a Algéria elaboraram um roteiro para o
aprofundamento de sua cooperação bilateral econômica e militar.
Em 2016,
O Ministro para o Magreb, União Africana e Liga dos Estados Árabes da Algéria,
Abdelkader Messahel, visitou a Síria, desafiando assim a política da Liga
Árabe.
Isso fez
parte de uma tendência geral. A Rússia está fazendo crescer muito sua
influência no Norte da África e no Oriente Médio. Sua base na região está
experimentando expansão significativa recentemente. Já foi solicitada a sua
intervenção militar na Líbia, tendo em vista a crescente ameaça do Estado
Islâmico em relação àquele país.
Ao ajudar
o maior país árabe, com uma costa de 1.200 quilômetros de extensão, Moscou
estará na realidade fornecendo uma grande contribuição para prevenir algo que
pode fazer com que a Europa entre em colapso. Devido à sua proximidade
geográfica, a Argélia é um parceiro privilegiado da França, e por extensão, da
União Europeia. Imagine o que poderia acontecer se um grande conflito interno
provocar um imenso fluxo de refugiados da Argélia para a Europa? O país é um
dos principais fornecedores de petróleo e gás para o ocidente, com a terceira
maior reserva convencional de petróleo da África (12.2 bilhões de barris) e
detentora da 10ª maior reserva de gás do mundo (4.5 trilhões de metros
cúbicos). As implicações de um conflito interno de grandes proporções podem ser
comparadas a um verdadeiro pesadelo.
A Argélia
– um dos maiores atores na luta contra o terrorismo na região – é também
componente chave para o diálogo dentro da Líbia. Não há possibilidade de
sucesso na administração das crises sem que Argel tome parte do processo. O
país é um baluarte contra os grupos terroristas que se espalham na Tunísia,
Líbia e Mali e outros países da região MENA (Middle
East and North Africa – Oriente Médio e Norte da África – NT).
A luta
contra o inimigo comum da Rússia e do ocidente pode mudar para o Norte da
África. Movendo-se constantemente, os terroristas passam e um país para outro.
Eles estão sempre a postos para tentar controlar regiões instáveis.
A
situação da Líbia pode piorar muito e criar um efeito dominó. O Norte da África
é uma região enorme e nenhuma nação dessa região está imune ao terrorismo que
se espalha, bem como a agitação social. A ameaça terrorista ali é real e séria.
Pode ter implicações ainda maiores que a do conflito na Síria. Se a situação
continuar a se deteriorar, pode se tornar indispensável um esforço
internacional de larga escala. Não deve haver divisões que compliquem as
relações entre ocidente e Rússia para tratar desse assunto perigoso para ambos.
A situação pede antes diálogo e
cooperação. As agitações em curso na Argélia são um alerta inicial que não deve
ser ignorado, para o bem de todos.
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