Estados Unidos pressionam cada vez mais a China
Apesar de seus
problemas de vários tipos aumentando (ou talvez por isso mesmo), os Estados
Unidos incrementam a pressão sobre seu principal rival geopolítico, que seja, a
República Popular da China (RPC). Washington não está só na tarefa, e tem
vários aliados que a apoiam tanto quanto possível. Os EUA estão também em busca
de parceiros que possam tornar-se futuros aliados.
A visita recente do
Secretário de Estado dos Estados Unidos Mike Pompeo ao Reino Unido e Dinamarca,
de 20 a 22 deste mês, serve como mais uma prova da crescente guinada anti-China
na política externa dos EUA. Também dignos de nota neste contexto foram os
exercícios militares marítimos conjuntos conduzidos pelas forças navais (norte)americanas
e indianas na Baía de Bengala nos últimos dez dias de julho.
Pompeo desembarcou
em Londres logo depois de uma reviravolta nas decisões do governo britânico.
Houvera um acordo prévio para cooperar com a gigante chinesa da tecnologia
Huawei na futura rede de 5G do Reino Unido. Vale a pena reiterar que a Huawei
acabou no meio da tempestade da guerra comercial entre Estados Unidos e China.
O objetivo de Washington no conflito é claro: eliminar um adversário forte no
mercado tecnológico da comunicação global.
Também é necessário
recordar aos leitores que há um ano (em maio de 2019), Mike Pompeo já
pressionava o governo do Reino Unido, na época liderado por Theresa May, para
que abandonasse seu acordo com a Huawei, que era muito lucrativo para a
Inglaterra. Agora o Secretário de Estado dos EUA visitou a capital de seu
principal aliado na Europa
O “visitante
querido” foi agraciado com os presentes de praxe. Já discuti alguns deles.
Estamos nos referindo ao plano, sob discussão neste momento, de mandar vários
navios da Marinha Real, liderados pelo último porta aviões classe Queen Elizabeth
para o extremo oriente no começo do próximo ano. O objetivo de fazer
praticamente a primeira presença de forças navais britânicas por ali nos
últimos 50 anos seria tomar parte em exercícios marítimos naquela região.
Até agora, os
Estados Unidos e o Japão foram mencionados como prováveis parceiros nesses
exercícios. Mas não se pode menosprezar a provável participação de outros
países nos exercícios militares internacionais, dado que há relatos de que
existem navios ancorados em Singapura, bem como em Darwin (Austrália) e Okinawa
(Japão). De pronto, estes acontecimentos recentes levam à questão: o Reino
Unido está planejando mesmo restabelecer sua presença em regiões “a leste do
Canal de Suez”, que abandonou há 50 anos?” Desta vez, a intenção do Inglaterra
poderia ser conter a ameaça representada pelo seu novo rival geopolítico, isto
é, A República Popular da China.
Caso a resposta
seja “sim” (levando-se em consideração a posição atual do Reino Unidos com a
Huawei, somada à atitude em relação aos conflitos em Hong Kong), uma questão se
levanta: “por que Londres está procurando problemas para si mesma?”. Pior,
parece fazer isso sem nenhuma necessidade óbvia. Afinal, é claro que Pequim não
hesitará em responder de acordo a todos esses movimentos não amigáveis e o preço a ser pago por Londres por um eventual
alinhamento comercial com os Estados Unidos nessa questão poderá ser caro.
Mostrei questões
similares antes sobre “manobras” também estranhas em relação à RPC tomadas há alguns meses pelo “irmão caçula” da Inglaterra, a
Austrália.
Incidentalmente, há
outras razões para que Pompeo esteja de bom humor enquanto em Londres.
Referimo-nos em primeiro lugar à decisão da TIM italiana de excluir a Huawei
para o seu suprimento da nova geração de serviços 5G. As novas devem ter sido
particularmente irritantes para Pequim desde que, em anos recentes, a Itália
tornou-se o portão de entrada da China para a Europa.
O Secretário de
Estado dos EUA só podia ficar satisfeito ao ouvir as novas (para surpresa deste
autor que não esperava por tais acontecimentos pelo menos até o final deste ano)
sobre o fato de que um grupo de navios da Marinha dos Estados Unidos liderados
pelo super porta aviões USS Nimitz, navegou através do Estreito de Malaca e
entrou na Baía de Bengala para completar seu último exercício naval no Mar do
Sul da China. Eles se encontraram com certo número de navios da marinha indiana
liderados pelo “porta aviões da classe Kiev modificado”, o Vikramaditya. Os
dois lados conduziram então exercícios marítimos conjuntos (Exercício de
Passagem, PASSEX [PASSEX é a denominação de exercícios navais para garantir
cooperação e facilidade de comunicação – NT]) supostamente sem qualquer
preparação ou planejamento prévio.
O jornal The Times of India relatou o episódio
acima mencionado, ressaltando como mudaram os tempos da política mundial últimos 50 anos. Em 1971, depois que a Índia entrou
em guerra pela Independência no Paquistão oriental (atual Bangladesh) ao lado
das forças nacionalista Bengalis e com o destino do lado ocidental (Paquistão
atual) em jogo, o presidente Richard Nixon ordenou que a “Força Tarefa 74 –
liderada pelo porta aviões USS Enterprise (predecessor do USS Nimitz) fosse
para a Baía de Bengala. O jornal também recordou aos seus leitores que o líder
dos EUA orientou seu Conselheiro de Segurança Nacional Henry Kissinger “a
explorar a opção da presença das forças navais (norte)americanas com
representantes chineses antes de tomar uma decisão final”. A mensagem que o USS
Enterprise “entregou” a Nova Déli não podia ser mais clara” estava proibido
mexer com o Paquistão ocidental. A liderança indiana aceitou.
Agora o USS Nimitz
chegou novamente à Baía de Bengala mas desta vez com uma mensagem diferente e
dirigida à China – abandonar suas ambições no Mar do Sul da China e parar de
causar problemas à Índia na região de Ladakh.
A reviravolta sobre
a qual o respeitado jornal escreveu é boa desculpa para comentários adicionais
sobre a aparentemente interminável especulação sobre uma “guerra fria” em
andamento (ou intensificada). Aqui, gostaria de enfatizar um ponto principal: o
termo “guerra fria” não é usado para descrever um acontecimento específico na
história política do mundo, mas apenas um “fragmento” de tempo, mais
precisamente de aproximadamente 1945 a 1990.
Nestes anos, os
dois “times” estavam presos apenas em um confronto “frio” (com poucas exceções)
no teatro europeu. Na Ásia, África e América Latina, o conflito às vezes se
tornava “quente”. Quando se fala sobre as características desse período,
pode-se mencionar sem medo que a ideologia teve papel primordial no confronto,
o que não é o caso atualmente.
Consequentemente, o
conflito hodierno de proporções mundiais é muito diferente do anterior. Afinal,
a paisagem política global, bem como seus atores principais sofreram mudança
significativa desde a Guerra Fria. A tentativa atual de alerta sensacionalista
de Mike Pompeo, que está tentando reviver a ideia de que o comunismo representa
uma ameaça ao retratar a liderança do Partido Comunista Chinês (PCC) com
principais oponentes dos Estados Unidos, desencadeando comentários sarcásticos
de Pequim, como exemplifica a manchete “EUA corteja o Vietnã comunista mas ameaça os membros do Partido Comunista Chinês”
Recentemente, a
liderança (norte)americana e seus aliados mais próximos estavam preocupados com
a crescente influência chinesa e seu principal projeto de desenvolvimento
estratégico global, a Iniciativa Cinturão e Estrada (ICE). Se fosse possível
colocar essa preocupação na linguagem das massas, poderia soar assim: “Pessoal!
Vamos parar de trombar uns com os outros e juntar forças em benefício próprio!”
Alguns
especialistas sobre a China afirmam que o papel de líder mundial não é familiar
para a RPC, que só o aceita com restrições e de cuidadosamente. Enquanto se
ajusta ao papel, surgem erros que a China é obrigada a consertar “com o carro
andando”. Além disso, a China tem disputas territoriais com quase todas as
nações vizinhas. É importante tentar resolver essas tensões em vez de
exacerbá-las.
Desde que a China
se encarregou da economia global, por que simplesmente não deixá-la assumir as
rédeas do assunto? Melhor apoiar seu esforço heroico (como mencionado
anteriormente) que provocar Pequim com os porta aviões USS Nimitz dos EUA e o
classe-Queen Elizabeth do Reino Unido.
Por outro lado, os
países possuidores desses navios são muito capazes de responder de forma
positiva às ambições chinesas acima mencionadas.
Exemplificando, há
relatos de que “o investimento estrangeiro real dos Estados Unidos para a China
cresceu 6% no primeiro semestre de 2020”, ou seja, justamente durante o período
que testemunha um súbito aumento nas tensões entre os Estados Unidos e a China.
Esse fato se destaca porque a “entrada de capital estrangeiro na China” estava
em decréscimo de 1,3% ano após ano. Recentemente, mais uma vez o governo da
Califórnia (por boas razões) expressou seu desejo de continuar a cooperação
com a China. Já um banco do Reino Unido anunciou que “deverá abrir um
centro de $40 milhões de dólares na província de Guangdong no Sul da China,
região importante com crescimento de alta qualidade”, nas imediações de Hong
Kong.
A “dança dos
sabres” entre líderes desses países, já descrita neste artigo, parece
especialmente ridícula dado o aumento dos problemas, a maioria dos quais
enfrentados por eles mesmos: a pandemia de coronavírus, pragas de gafanhotos, a
perspectiva da fome que ameaça muitos nações e chuvas excepcionalmente fortes,
não vistas há décadas atingindo continentes inteiros. Para que acrescentar
questões difíceis criadas pelo homem, por razões menores, ou por falta de
razão, aos problemas acima expostos?
Será que os
especialistas da TV, que regularmente falam besteiras sobre questões como a
inevitabilidade da Guerra, a prioridade dos Estados Unidos de destruir a China
ou a Rússia ou, pelo contrário sobre a inevitabilidade do colapso dos Estados
Unidos, por causa de seu tamanho exagerado realmente certos? Este autor reluta
em acreditar que esta coisa sem sentido esteja ancorada na realidade.
Afinal, tudo está
em nossas mãos, nós, os humanos. Tanto ações estúpidas quanto inteligentes.
Vale a pena acreditar que as últimas prevalecerão.
Vladimir Terehov é especialista em assuntos da região da Ásia/Pacífico.
Comentários
Postar um comentário